sexta-feira, 27 de março de 2009

Lugares de passagem. Ou serão de partida?

Gosto de aeroportos, estações de comboio, paragens de autocarro. Onde gente chega e parte sem cessar. Lugares de passagem. Onde quem parte espera, onde quem chega é esperado. Houve tempos, em Lisboa, onde depois de 6 meses sem voar olhava os céus e pensava: está na minha hora; que saudades de partir. Lugares de passagem encerram em si uma simbologia de iniciação. Não chego a tanto. Só sei partir, mudar de lugar. Escrever faz-me gostar de esperar. Olhar, e registar de imediato o que vejo, altera o tempo, muda a velocidade dos ponteiros do relógio.
À minha frente, com os pés em cima das malas um homem lê um livro de páginas amarelas e capa mole. À sua esquerda sentou-se um casal alemão. Ele careca, mais velho do que ela. Ela magra, sem ancas, enfiada numas calças de ganga que lhe deixam o rabo quadrado. Chegam sem palavras, sentam-se em silêncio, trocam palavras ríspidas e secas. De novo o silêncio.
Somos três, os que teclamos em computadores portáteis. Um indiano com os dedos cravejados de anéis de várias pedras - cada um para seu chackra e vários para o sucesso e dinheiro - não pára de falar ao telemóvel. Entre mim e o senhor do livro de páginas amareladas acaba de se sentar outro firangi (estrangeiro em hindi). Cabeça rapada, camisa branca, calças de ganga, casaco beje, anel de brazão. Óculos de massa pretos e touchphone, no qual os dedos grossos tocam sem cessar. Por baixo das mangas do casaco, até aos pulsos e sabe-se lá desde onde, uma enorme e escura tatuagem parece combinar com o azul do denim.
Está tudo calmo, silencioso e limpo. O lugar é novo, amplo e minimal. Não há duvidas que a estética, a arquitectura e o design podem mudar comportamentos e mentalidades.
Bangalore, 2009

1 comentário:

  1. Gosto... um aeroporto tem sempre um ambiente especial e até já foi usado como ponto de partida e de chegada de amores que acontecem...

    ResponderEliminar