terça-feira, 19 de abril de 2011

Cronos, Zeus e Piaf

Não sei o que se pode fazer ou deixar de fazer porque o tempo urge. Rugem os minutos e os segundos não taque-ticam como no recordado mas agora parado relógio de laca preta e de caixa alta com motivos chineses. O seu som enlouquece as feras escondidas que nos homens habitam sem serem ouvidas.
O tempo urgiu e deixou de urgir e o que foi feito e o que não se fez ficou desasado entre o poder ter sido mais, ou menos, ou diferente, ou não ter sido sequer.
Cronos filho de Urano continua vivo comendo os filhos que pode para que nada de mais ou de maior cresça. Tudo tem de ficar como está, que a viagem é inevitável e é preciso partir e é preciso ficar.
Não concedo a Cronos qualquer efeito paliativo senão o de dar ao ser a possibilidade de se transformar ou de em imutante ou imutável se tornar. Sem Cronos não há pensamento nem consciência que são tarefas do sujeito a quem cabe ou não recusá-las.
Almejo a imortalidade do invisível que feito não se desfaz.
Talvez não possa juntar aos Deuses uma meretriz, mesmo depois de já não o ser, mas depois de Cronos e Zeus é Edith Piaf que me volta à cabeça, tal como me revolve há muito o pensamento o que nestes três se fez símbolo.

Uma história de resto

há uma intimidade feliz
que se montou num foguete
e rebentou numa só cor
sem alarido
não foi à vista de todos
e por menos ainda se fez audível
há sempre quem prefira não ver
e quem tenha os ouvidos almofadados
o que fizera na primeira vez que ousou
quando saltou a muralha
e deu a mão à menina que encontrou
nunca mais voltara a acontecer
a menina caíu
e a mão desapareceu
e a vida é uma oportunidade única
e a menina voltou a levantar-se sozinha
e daquela mão só voltou a ver
os dedos acusadores
fôra talvez impressão
forte demais para só parecer
para não se sentir
para não deixar marca
foi a primeira mão
que a menina viu
havia tanto tempo
parece que a mão está lá sempre
mas à menina foi pedido
esforço para a agarrar
e a menina pediu então
o que recebera e lhe fôra tirado
sem pedir
mas a menina voltou a dormir 
com as mãos junto ao peito, entrelaçadas
e com ar de mimo deixou de estender a mão
mimo não é capricho
e também não é mimo, é medo
há que proteger o lugar onde reside o ser
não estará a menina
a estender a mão agora?
a menina acocorou-me na praia
quando viu o barco partir
zangada ou triste, nem sabia
acertou com algumas pedras no casco
crescer é ser
não é saber viver
união é partilha de resto zero.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Três pedras no charcos, três passos do Universo

Parece que os santos que não ajudam para baixo são os que empurram. Devem ser como as injecções nas nádegas. O charco sou eu e nele cairam três pedras: uma pedrinha, uma pedra e um pedragulho. Dois empurrões díspares e um traumatismo cardio-craneano, nem médico nem sentimental. Confesso-me confiante no poder das agulhas, da aventura e do circo. Eu não preciso de rede e só a serei para os que do meu cordão se fizeram.
Sonho e quero. Simples e franco, Um fim partilhado, duradouro nos céus, intermitente na terra.