terça-feira, 31 de julho de 2012

A clarabóia e o jardineiro

Estou cheia de coisas boas. Coisas que não se trocam por pedras ou metais preciosos. Coisas a que a moeda não chega nunca. Tenho a minha luz acesa. Uma brasa vermelha, estelar, aquece-me.  Não tenho frio e no meu coração habitam tantos seres de Amor. No seu topo, bem no alto, há uma clarabóia que distribui luz por todos os aposentos e sob ela está um quarto vazio há tempo demais. Visito-o todos os dias, deito-me na cama olhando o céu, sento-me à janela olhando o mar e espero pelo dia em que feliz possa cheirar o teu sorriso.
Afastei o desânimo e olho as laranjas sãs que a árvore me oferece. O pomar cresceu este ano selvagem. Sem jardineiro nas nuvens e sem jardineiro na terra.

Lisboa, Dezembro de 2011

                                                   Mafalda Mimoso 2012

Enfeites

Oval, na sua casca fina, nem branca, nem castanha, espera vazio, no seu casulo velho e preto.
Esvaído por um furo, enfeitado para a morte ou para o nascimento, adormece num cesto ou jaz enforcado numa árvore.
Frágil, quebradiço, reciclado entre mezinhas fortificantes ou iguarias mexidas, vê assim a sua vida prolongada.
Até que se rebobine o filme e a semente de vida esgotada retorne, renovada.

Lisboa, Novembro de 2011

domingo, 29 de julho de 2012

Cogumelos mágicos

Há os que cruzam a vida sem possibilidade, probabilidade ou desígnio.
Há os que navegam o rio sem deixar de parar no possível, sem estender o braço ao provável, sem largar a amarra do planeado.
Há os que nem uma coisa, nem outra. O que já foi feito, o que feito foi incontáveis vezes - o provável, diriam muitos - não os impede de se atirarem ao rio. Os bancos de areia, os rápidos, os redemoinhos, as curvas rochosas, os troncos submersos, não lhe são invisíveis, nem desconhecidos o seu alcance e proporção. Não são os sonhos, nem a geografia que lhes alimenta a alma. Eles comem cogumelos mágicos que brilham no escuro.

sábado, 28 de julho de 2012

terça-feira, 24 de julho de 2012

Bola de pêlo


É estranho como anda dentro de mim uma bola de pêlo que não consigo vomitar. Sinto as convulsões, as frases rodopiam na minha cabeça, o coração está dorido e nada sai. Ou sai, o mesmo e para nada. É- me muito difícil viver sem partilha e sem entrega de corpos e almas. Crescem as dúvidas sobre quem é o outro comigo. Adorava que esta história confirmasse a minha teoria do âmago e do resto. E gostava que fôssemos, para cada um, um espaço e tempo de paragem, de liberdade para ser sem medos. Abertos e soltos.
Lisboa, Janeiro 2012